Fotos: Márcio Almeida de Bueno
Então alguém aperta um botão escrito ‘Páscoa’, e as pessoas todas – a maioria – passam a se agitar em um ritmo diferente, que inclui filas nas lojas, crianças com orelhas de coelho e comida específica. Juro que gostaria de saber o nome desse alguém, mas enfim. E dentro dessa cantilena hipnótica que parece vir do frenesi ‘com estrelinha’ lá de fora, alguém botou o aviso de que tem que comer peixe. Aliás, tem que COMPRAR peixe, antes de tudo – mais uma rotina a ser cumprida por uma massa humana que não se pergunta, não se questiona, apenas rebola no ritmo que o bambolê das tradições dita a seus quadris.
No Centro de Porto Alegre, em algo chamado de, vejam só, Semana Santa, a Prefeitura instala um pavilhão com dezenas de bancas que vendem peixe ‘fresco’, resfriado ou congelado, algumas que vendem peixe frito ou assado em churrasqueira, além de uma que, atração principal, vende o sagrado ainda vivo. Todas as etapas da serventia.
É uma experiência e tanto ficar alguns minutos ao redor dos tanques, vendo carpas de quase dez quilos debaterem-se em uma água suja. Às vezes aparenta ser um único animal, com inúmeros tentáculos saindo para fora da água, com uma plateia cativa que reage, conforme a emoção, com risadas, espanto, indignação ou mesmo com o olhar vitrificado de quem apenas coleciona paisagens durante a vida, e não se abala. Outros batem fotos com o celular, o que dá no mesmo.
Alguns se assustam ao verem aquele pré-bolo fecal de carpas enroscando-se e até pulando para fora – o que faz juntar mais gente ao redor do cercado. Ok, vai comer alguma carne logo ali adiante – há o histórico peixe na taquara, que todos os políticos locais estilo papagaio-de-pirata vão se prestar a saborear, na abertura da ‘feira’. Mas é interessante reparar que o processo de morte daquele que nasceu para ser ingrediente culinário AINDA é algo que choca e causa perplexidade a certos, no esquema ‘… mas nunca pensei nisso’. Para quem acha que todo mundo já sabe de tudo, e os ativistas não têm por que se manifestarem.
E o circo completo, de calçadão melequento e mais fedido que o habitual, caminhões refrigerados com funcionários mal-encarados pacas, cheiro de fritura, churrasco de não-carne – o peixe – e tudo mais, existe pela tradição de uma facção religiosa. Não que todos os consumidores ali se acotovelando, em busca da melhor oferta, sejam cristãos com letra maiúscula – é bem visível que a coisa funciona apenas pelo lado ‘Macaco Simão mandou… pular em uma perna só!’, tal qual aquela brincadeira da infãncia.
A mistura de padre abençoando aquele lugar, arena de peixes já zumbis despertando um apetite torto nos pais-de-família e donas-de-casa que ali passam, Semana Santa, jejum, ovo, ‘ei, diz que eu mandei Feliz Páscoa pro Osvaldo’, crianças com orelhas de coelho, água fétida no chão, bombons a R$ 1,99 e filés sem cabeça sendo negociados no grito, mais uma vez tem o carimbo da tradição.
Uma tradição de abuso físico e psicológico, roubo de liberdade, morte e deboche dos animais não-humanos. Alguém aí me faça o link com um suposto respeito ao Jesus que morreria em breve, porque eu jamais engoli – ops – tudo isso.
Por Vanessa Dalla:
Sempre fui da opinião que esse tipo de data é um pretexto - desconhecido, ou ignorado cegamente - do capitalismo para: VENDER, VENDER, CONSUMIR, CONSUMIR, DESPERDIÇAR, ESTRAGAR, APODRECER, LUCRAR. Tá tão na cara, tão debaixo dos olhos, que ninguém vê. E o que vêem menos ainda é esse outro tipo de bárbarie: o abuso dos animais que não compartilham exatamente do mesmo corpo físico que nós, humanos. A capacidade de pensar livremente hoje está distante das cabeças comuns - basta parar e olhar; porque ninguém nunca se pergunta como tudo aquilo foi parar ali, que consequências trouxe para a vida marinha (no caso), e também PORQUE EU PRECISO DISTO?
Se eu disser que a cegueira mata, vão me condenar. Se alguém morre de cegueira, é só mais um.
Sempre fui da opinião que esse tipo de data é um pretexto - desconhecido, ou ignorado cegamente - do capitalismo para: VENDER, VENDER, CONSUMIR, CONSUMIR, DESPERDIÇAR, ESTRAGAR, APODRECER, LUCRAR. Tá tão na cara, tão debaixo dos olhos, que ninguém vê. E o que vêem menos ainda é esse outro tipo de bárbarie: o abuso dos animais que não compartilham exatamente do mesmo corpo físico que nós, humanos. A capacidade de pensar livremente hoje está distante das cabeças comuns - basta parar e olhar; porque ninguém nunca se pergunta como tudo aquilo foi parar ali, que consequências trouxe para a vida marinha (no caso), e também PORQUE EU PRECISO DISTO?
Se eu disser que a cegueira mata, vão me condenar. Se alguém morre de cegueira, é só mais um.
*Vocês vão sentir uma breve conexão com esse post e o próximo. Quando? não sei.