sábado, 21 de agosto de 2010

Assassinatos na Rua Morgue e outros contos - Edgar Allan Poe


Qualquer pessoa que cultue um bom gosto pela leitura deve se remeter à literatura do século XIX, mais precisamente à Edgar Allan Poe. Ora, basicamente, porque foi aí que nasceu o romance policial, e é sempre gostoso saber onde nasceram as coisas. Poa nasceu em 1809 e viveu até 1849. Esse tempo curto de vida foi suficiente para a produção de inúmeros contos e histórias macabros, que lhe renderam muita fama durante a vida e após ela. Seus textos revelam uma obsessão neurótica e atormentada pela morte e pela violência, e a apreciação dos belos -ainda que trágicos - mistérios da vida.

Essa antologia da L&PM Pocket é fantástica, mostra toda a perversidade e sagacidade de Poe. Perversidade essa que é tema principal do primeiro conto selecionado. Bom conto, mas nem tão empolgante assim, embora que sua linha psicológica nos faça analisar algumas situações com outro ângulo; ele diz que temos, como seres humanos, atração por tudo o que pode ser perigoso, trágico, inclusive por coisas que possam por um vim na nossa vida. Essas coisas nos são instigantes, justamente por esse sentimento de perversidade, que se não soubermos controlar dentro de nós, adeus. E a perversidade é algo intrínseco dos humanos. Quem nunca se pegou numa situação em que não podia fazer algo, mas a perversidade lhe dizia que devia? Bem, o narrador-personagem dá inúmeros e bons exemplos, inclusive o de sua própria história de vida, e como foi parar atrás das grades. Tudo, diz ele, culpa do "Demônio da Perversidade".

O próximo, "Hop-Frog e os oito orangotangos acorrentados", é narrado em 3ª pessoa e trata da ridicularização e humilhação sofridas por um anão na corte do Rei, que exigia que o pobre anão exibisse um comportamento de bobo da corte, sofrendo todas as consequências, tudo para satisfazer seu humor ácido e atroz. Mas o anão acaba por se demonstrar mais eserto que um simples bobo, e na primeira oportunidade engana o Rei e seus comparsas num plano maquiavélico e faz de sua vingança um espetáculo à parte.

O sombrio "Os fatos que envolveram o caso de Mr. Valdemar" trata das experiências hipnóticas do narrador, que experimentaria, pela primeira vez, a hipnose in articulo mortis¹. O objetivo do estudo era, entre outros, ver até onde e por quanto tempo a morte poderia ser interrompida de um doente terminal. É uma história mórbida e nauseante. O próximo "O gato preto", é um conto gótico, cheio de superstições e assombrações, onde vemos a decomposição de um caráter humanizado para o de um monstro, e suas terríveis consequências, ultrapassando qualquer limite de sanidade mental. Muito bom, muito bom. Já o satírico "Nunca aposte sua cabeça com o Diabo" traz o relato da vida de um jovem, que por qualquer coisa adorava "apostar a cabeça", crente de que ao corpo ela estava bem presa. Não ouvia os conselhos do amigo-narrador, e em qualquer situação em que uma aposta fosse cabível, ele lá apostava. Até que, em um momento de insistência (e confuso, confesso), ele apostou a cabeça pela última vez. E a perdeu.

E no final vem o conto que dá nome à coleção, o detetivesco "Assassinatos na Rua Morgue". É brilhante e possui um raciocínio lógico de deslumbrar - dentro do fantasioso, claro. A parte sanguinária do conto é de arrepiar, e o desenvolvimento das investigações, feitas por um sugeito de sagacidade impecável, é de abrir os olhos. É rico em detalhes e a primeira parte traz um pouco de análise psicológica - tudo para introduzir o leitor no ambiente e se habituar com estilo de raciocínio de quem vai ser nosso detetive, portador de uma mente incomum.
Não dá para negar que a mente de Poe é brilhante. Você pode não se adaptar ao estilo, ou não gostar dessas histórias sobre corpos despedaçados, mas o trabalho com a psique é digno de análise freudiana. Os confins da mente humana são abordados, sempre trazendo à tona o lado mais sombrio, sagaz, perturbado, obscuro, com detalhes condenáveis pelo senso comum, que dão ao texto maior profundidade e expectativa. Lembrando que são contos, histórias curtas, por isso esse cuidado em introduzir o leitor no que está acontecendo e o instigando a ver tudo por esse lado, o do trabalho da mente. Não é à toa que Poe é reverenciado até hoje, vista a abertura que deixou para a literatura desenvolver os temas de mistério, detetivesco, gótico, etc., com obras tão significativas e gratificantes de se ler.


¹. No momento da morte, em latin, no original.

Site legal sobre Poe, com link para os contos (em inglês): Literature

3 comentários:

  1. Edgar realmente assusta seus leitores! As histórias prendem a curiosidade até o fim, ainda que trágicos e absurdamente perversos sejam estas. Eis um homem inteligente e misterioso.

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  2. Poe, Meu favorito.
    Parabéns pelo blog. fantásticas resenhas.

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